O PAPEL DOS ÁCIDOS BILIARES NA COLESTASE INTRA-HEPÁTICA DA GRAVIDEZ E SEUS IMPACTOS NA SAÚDE MATERNO-FETAL

O PAPEL DOS ÁCIDOS BILIARES NA COLESTASE INTRA-HEPÁTICA DA GRAVIDEZ E SEUS IMPACTOS NA SAÚDE MATERNO-FETAL

A colestase intra-hepática da gravidez (CIG) é uma desordem hepática que ocorre geralmente no terceiro trimestre, é caracterizada por níveis elevados de ácido biliar (AB) materno e por prurido intenso.

Esta condição, embora considerada benigna para a mãe, está associada a riscos significativos para o feto, incluindo parto prematuro, sofrimento fetal, e até morte intrauterina. O entendimento do papel dos ácidos biliares na fisiopatologia da CIG é crucial para desenvolver estratégias terapêuticas eficazes e reduzir os riscos associados. A CIG grave, definida por níveis de AB ≥100 μmol/L, está associada a riscos aumentados de parto prematuro espontâneo, líquido amniótico manchado de mecônio e morte perinatal.

Os ácidos biliares são ácidos esteroides derivados do colesterol sintetizados no fígado que desempenham papéis cruciais na digestão e absorção de lipídios. Além de suas funções tradicionais, os ABs surgiram como importantes moléculas de sinalização, atuando como ligantes para receptores nucleares e de superfície celular, como FXR e TGR5. Essas interações regulam o metabolismo da glicose e dos lipídios em vários tecidos. Pesquisas recentes identificaram 20 ABs diferentes no sistema nervoso central, onde influenciam os receptores de neurotransmissores e exibem propriedades neuroprotetoras. Em condições normais, os ácidos biliares são secretados na bile e armazenados na vesícula biliar, sendo liberados no intestino após a ingestão de alimentos. Na CIG, ocorre um acúmulo anormal desses ABs no sangue, devido à redução na excreção biliar.

Níveis elevados de AB podem contribuir para complicações fetais por meio da vasoconstrição das veias coriônicas placentárias, levando potencialmente à redução da perfusão e oxigenação fetal. Os níveis de AB maternos correlacionam-se positivamente com os níveis de AB no sangue do cordão umbilical, sugerindo uma ligação direta entre colestase materna e exposição fetal.

Esse acúmulo resulta de alterações hormonais que impactam a função hepática durante a gravidez. O estrogênio e a progesterona, que aumentam significativamente durante a gestação, podem inibir a atividade de transportadores hepáticos responsáveis pela secreção dos ácidos biliares na bile. Além disso, a CIG está associada a variações genéticas em genes codificadores de proteínas transportadoras. Estudos demonstraram que variantes do gene ABCB4, que codifica o transportador de fosfolipídios hepatobiliares, estão ligadas à CIG grave. Mutações nos genes ATP8B1, ABCB11 e ABCB4 foram implicadas na etiologia da CIG. Polimorfismos de nucleotídeo único no gene ABCB11, que codifica a bomba de exportação de sais biliares, foram associados à suscetibilidade à CIG.

O ácido ursodesoxicólico (AUDC) é o tratamento mais amplamente estudado, mostrando provável eficácia na redução do prurido, embora o significado clínico desse efeito seja discutível. O UDCA atua promovendo a secreção biliar e protegendo os hepatócitos dos efeitos tóxicos dos ácidos biliares acumulados. Outras intervenções, como S-adenosilmetionina (SAMe), goma guar e carvão ativado, foram investigadas, mas as evidências de sua eficácia são insuficientes. O gerenciamento da CIG envolve o monitoramento da função hepática materna e dos níveis de ácido biliar, a avaliação do bem-estar fetal e a consideração do parto oportuno para evitar complicações.

O diagnóstico precoce e o tratamento da CIG com base nos níveis de AB são cruciais para reduzir o risco de complicações fetais. Deste modo, a dosagem dos ácidos biliares é crucial na prática clínica, especialmente durante a gestação. A monitorização dos ABs permite a identificação precoce da condição, possibilitando intervenções que reduzem o risco de complicações graves, como parto prematuro e morte fetal intrauterina. Estudos demonstram que a detecção de níveis séricos elevados de ABs está diretamente associada a um aumento no risco de desfechos adversos para o feto, sublinhando a importância de um monitoramento rigoroso durante a gestação.

 

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