O PAPEL DO CORTISOL NO ESTRESSE E DOENÇAS NEURODEGENERATIVAS
O PAPEL DO CORTISOL NO ESTRESSE E DOENÇAS NEURODEGENERATIVAS
O cortisol é liberado em resposta ao estresse através do eixo hipotálamo-pituitária-adrenal (HPA). Em situações de estresse agudo, ele ajuda a mobilizar energia, modulando a gliconeogênese hepática, a lipólise e a degradação de proteínas. Contudo, a exposição prolongada ao estresse e, consequentemente, a níveis elevados de cortisol pode levar a uma série de efeitos adversos, incluindo a disfunção imunológica, resistência à insulina e danos estruturais ao cérebro, particularmente ao hipocampo.
O cortisol é essencial à vida e possui múltiplos efeitos. Geralmente, sua ação é catabólica. No metabolismo, ele promove a degradação de proteínas, a lipólise, a gliconeogênese, a produção de glicose pelo fígado, o apetite, a síntese de leptina e a diferenciação de adipócitos, enquanto inibe a síntese proteica e o uso de glicose. Dessa forma, antagoniza a insulina, sendo crucial no jejum. Inibindo a síntese e promovendo a degradação proteica, diminui a massa muscular e a matriz conjuntiva. Nos ossos, reduz a osteogênese e aumenta a reabsorção de cálcio, podendo causar osteoporose em níveis elevados e persistentes. Nos rins, aumenta a filtração glomerular, a excreção de fosfato e o clearance de “água livre”. Possui efeitos anti-inflamatórios e imunossupressores significativos, facilita a maturação fetal e impacta o Sistema Nervoso Central, influenciando memória, atenção, sono e estado emocional.
O hipocampo, uma região cerebral crítica para a memória e aprendizagem, é especialmente vulnerável aos efeitos neurotóxicos do cortisol. Níveis elevados de cortisol têm sido correlacionados com a atrofia hipocampal e comprometimento cognitivo em indivíduos com Doença de Alzheimer. Estudos mostram que a exposição prolongada ao cortisol pode exacerbar a formação de placas amiloides e emaranhados neurofibrilares, características patológicas da Doença de Alzheimer.
A relação entre estresse e depressão é intrincada, com o hipocampo desempenhando um papel crucial. Pacientes deprimidos frequentemente apresentam níveis elevados de cortisol e redução no volume hipocampal. Essas alterações podem ser tanto causas quanto consequências da depressão. A condição depressiva pode intensificar a resposta ao estresse, criando um ciclo vicioso que agrava os danos ao hipocampo e perpetua a desordem depressiva. A interação entre estresse, cortisol e hipocampo é fundamental para compreender a fisiopatologia da depressão. Intervenções que visem reduzir os níveis de cortisol ou proteger o hipocampo dos efeitos do estresse podem ser eficazes no tratamento da depressão.
Na Doença de Alzheimer, a disfunção do eixo HPA e a subsequente hipercortisolemia estão implicadas na patogênese da doença. Evidências sugerem que níveis elevados de cortisol não apenas contribuem para o dano neuronal, mas também para a neuroinflamação e a disfunção sináptica. A associação entre cortisol elevado e comprometimento cognitivo tem sido observada tanto em modelos animais quanto em estudos clínicos com humanos. Na Doença de Parkinson, há uma evidência crescente de que o estresse crônico e a elevação do cortisol estão associados à progressão da neurodegeneração. O cortisol pode exacerbar a perda de neurônios dopaminérgicos na substantia nigra, uma característica central desta doença. Estudos recentes sugerem que o manejo do estresse e a modulação dos níveis de cortisol podem ser estratégias terapêuticas potenciais para retardar a progressão da Doença de Parkinson.
Os mecanismos pelos quais o cortisol influencia as doenças neurodegenerativas são complexos e multifacetados. A neuroinflamação, induzida pelo cortisol, resulta na ativação de microglia e na liberação de citocinas pró-inflamatórias, que podem promover a neurodegeneração. Além disso, o cortisol pode induzir a disfunção mitocondrial e o estresse oxidativo, ambos conhecidos por contribuir para a morte neuronal. Alterações na expressão de receptores de glicocorticoides no cérebro também têm sido associadas a vulnerabilidade neuronal aumentada.
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